A aventura em clima cerimonial da transposição de Peter Jackson para O Senhor dos Anéis hoje me faz coçar a cabeça desconfiado. E acho até curioso que não apareceu nenhuma sátira contundente ao excesso de heroísmo e gestos grandiosos dos personagens, porque Jackson levantou respeitosamente a bola, e ninguém cortou como podia (que saudades da turma do Monty Python!).

O Hobbit

Pois agora temos novas chances com “O Hobbit” e elas são maiores.
Se havia um mérito na saga cinematográfica anterior é que se sentia o empenho, a paixão do ou tudo-ou-nada para garantir que finalmente a obra de Tolkien chegasse ao cinema. Aqui, nada disso: fica-nos a dúvida sobre se as considerações artísticas de fazer justiça ao Hobbit chegaram primeiro ou foram as considerações comerciais de assinar outro blockbuster de prestígio (coisa que, há dez anos, estava longe de ser garantida).
A produção é caprichada e bem polida, mas já sabemos onde vamos e procuramos o sentido de diversão, numa narrativa que custa a desenrolar. Estão lá o velho Gandalf (um Ian Mckellen simpático até quando interpreta no piloto automático), o bondoso Bilbo Bolseiro (Martin Freeman se esforçando para garantir o carisma), e treze anões feios sujos e desajeitados, que podiam ser muito engraçados, mas são pouco.
É verdade que o legado de Tolkien permitiria outra dimensão de espetáculo e diversão. E não menos verdade que, em breves momentos (em especial em torno do bizarro Gollum, o “boneco digital” fabricado a partir da composição de Andy Serkis), compreendemos que há, aqui, muitas potencialidades que ficam por explorar. Mas Jackson não consegue ir além. Percorre o caminho sem um rasgo, sem uma surpresa, sem qualquer efeito que marque a diferença.